80’s Bits

Um artigo de Ricardo Tarré Gomes

Bem-vindos a ‘80’s Bits’, a nova rubrica do 8.5Bits! Mensalmente será recuperado neste espaço um filme, um álbum de música e um videojogo da mítica década de 80 do século passado. Não será como um exercício relativamente comum de tentar eleger os melhores ou mesmo os mais populares desse tempo mas sim apenas uma escolha pessoal tendo em conta as minhas vivências desde o início de 1980 até ao final da década e mesmo o efeito e a influência que me deixaram posteriormente muitos desses conteúdos.

Filme: ‘Regresso ao Futuro’ (1985)

Marty Mcfly (Michael J. Fox), um jovem americano dos anos 80, acciona acidentalmente uma máquina do tempo construída num automóvel Delorean pelo excêntrico cientista Emmett “Doc” Brown (Christopher Lloyd) e regressa ao ano de 1955. Preso no passado e sem saber como voltar, conhece a sua futura mãe — antes do casamento com o seu pai — que fica apaixonada por ele, colocando assim em risco a sua própria existência. Marty terá de fazer tudo para que os jovens que um dia virão a ser os seus pais se conheçam e se apaixonem, e convencer o desconfiado “Doc”, trinta anos mais novo, a enviá-lo de regresso ao futuro…

Que melhor maneira de iniciar esta rubrica, que funciona como uma espécie de regresso ao passado, senão com o melhor filme de sempre sobre viagens no tempo? Realizado por Robert Zemeckis e escrito pelo mesmo juntamente com Bob Gale, ‘Regresso ao Futuro’ foi um tremendo sucesso de bilheteiras e da crítica pela forma como misturou aventura, comédia e ficção científica em doses certas num mesmo filme. Com interpretações definidoras de uma carreira por parte de Fox e Lloyd, para além de Lea Thompson e Crispin Glover como os pais de Marty, destacam-se ainda a excelente música de Alan Silvestri, a boa banda-sonora que inclui ‘Power of Love’ de Huey Lewis and the News e os efeitos sonoros, que acabaram premiados com o Oscar. De referir que o filme teve duas sequelas, ‘Regresso ao Futuro II’ (1989) e ‘Regresso ao Futuro III’ (1990), ambas interessantes e com várias sequências memoráveis mas sem nunca alcançar o brilhantismo do primeiro filme.

Não me recordo se a primeira vez que vi o filme foi quando estreou cá na televisão ou se foi através de aluguer no clube de vídeo mas sei que fiquei deslumbrado! Todo aquele conceito de viagem no tempo fascinou-me e era frequente sonhar com isso. Quem nunca gostaria de ter podido visitar o tempo de juventude dos nossos pais? Ou outro tempo qualquer? Zemeckis assina aqui a sua obra-prima (perdoa-me, Forrest Gump) e é de louvar que, em tempos de fraca inspiração Hollywoodesca e onde abundam os remakes e reboots de alguns clássicos, os criadores e argumentistas de ‘Regresso ao Futuro’ recusem liminarmente que se faça uma nova versão do mesmo. E ainda bem, deixem os clássicos em paz! Great Scott!

Álbum: ‘The Final Countdown’ — Europe (1986)

É caso para dizer que à terceira foi de vez. Formados em 1979 e depois de dois álbuns com um som mais pesado e que passaram algo despercebidos até no seu país natal, os suecos Europe alcançaram o estrelato e reconhecimento internacional em 1986 com o seu terceiro trabalho de originais intitulado ‘The Final Countdown’. Com um estilo musical alternando entre o hard rock e o glam metal, a banda beneficiou do enorme sucesso à escala planetária que foi a canção que dá o nome ao próprio álbum. Para além da referida música (e muito devido ao sucesso desta), outras quatro canções foram lançadas como singles: ‘Rock the Night’, ‘Carrie’, Cherokee’ e ‘Love Chaser’, esta última apenas no Japão. O quinteto originário dos arredores de Estocolmo, onde se destacam o virtuoso guitarrista John Norum e o vocalista e principal compositor Joey Tempest, lançaria mais dois álbums: ‘Out of This World’, de 1988 e ‘Prisoners in Paradise’, de 1991, que enfrentou vários problemas de produção e distribuição, conduzindo a banda a um longo hiato de inactividade de 1992 até 2003, quando regressou aos palcos. Actualmente os Europe mantém-se em actividade mas desapareceram completamente do “radar”, apesar dos seis álbuns de originais lançados desde o regresso.

‘The Final Countdown’, a música, é sobejamente conhecida por quem já era nascido nos anos oitenta mas também por quem ainda não o era, uma vez que tem marcado presença em vários meios desde bandas-sonoras, publicidade, arenas e eventos desportivos, passagens de ano ou quaisquer colectâneas de canções emblemáticas da época ou listas de karaoke. Facilmente reconhecida pelo seu início característico de sintetizador, o seu sucesso foi uma surpresa para a própria banda. O riff de teclas inicial foi composto quase por passatempo por Tempest, que o mostrou ao baixista John Léven e foi encorajado por este a escrever uma canção a partir desse trecho. Inspirado pela temática da ‘Space Oddity’ de David Bowie, o vocalista apresentou o resultado final ao resto da banda e as opiniões dividiram-se quanto a escolher a música como primeiro single do álbum. Felizmente para os Europe, a decisão final da Epic Records foi lançá-la como grande aposta do álbum e o resultado foram mais de 15 milhões de exemplares vendidos, nº1 em 25 países e vendas a atingirem tripla platina no exigente mercado norte-americano.

Em casa sempre fomos grandes consumidores de música, desde os discos de vinil antigos dos meus pais às cassetes áudio dos meus irmãos mais velhos, fossem de originais ou de colectâneas próprias gravadas da rádio. O momento em que o meu irmão mais velho começou a sua própria colecção de discos de vinil, os chamados LP, foi marcante. O primeiro de todos foi, precisamente, este ‘The Final Countdown’. Para além das vezes que passava na rádio, também o videoclip (na altura chamado teledisco) da canção homónima passava regularmente nos programas de música da RTP e até por aqui se percebe como a banda não esperava tal sucesso pois apenas foi filmado e lançado após o sucesso de canção, mostrando a banda em palco, em digressão e ostentando discos de ouro. É certamente das músicas e álbuns que mais ouvi nos anos 80, tal as vezes que rodou no gira-discos, e consigo identificar trechos do álbum que me trazem imediatas recordações de chegar a casa vindo da escola primária e os meus irmãos estarem a ouvir o disco. Por estarem tão gravadas na minha memória, ainda consigo identificar, senão todas as letras, pelo menos o tom de todas as linhas vocais. Uma curiosidade final para a popularidade dos Europe… na Europa. Num desses verões da segunda metade dos anos 80, talvez 1987, uma prima francesa gravou uma colectânea de músicas passadas nas rádios gaulesas para nos oferecer e, curiosamente, entre todas as músicas presentes, só uma não era em língua francesa: ‘Carrie’, dos Europe.

Videojogo: ‘Golden Axe’ (1989)

Num tempo medieval e de fantasia encontra-se a terra de Yuria, onde uma entidade maligna de nome Death Adder capturou o Rei e a sua filha e aprisionou-os no seu castelo. O vilão também se apoderou do “Machado Dourado”, o amuleto mágico de Yuria, e ameaça destrui-lo assim como a família real, caso a população não o reconheça como seu líder. Três guerreiros emergem com a missão de salvar Yuria e vingar a morte dos seus entes queridos às mãos de Death Adder. São eles: Ax Battler, um forte guerreiro ao estilo de ‘Conan, o Bárbaro’, Tyris Flare, uma amazona de espada e movimentos ágeis e Gilius Thunderhead, um anão lutador empunhando um machado, possivelmente influenciado pela literatura de ‘O Senhor dos Anéis’.

Um dos maiores clássicos de sempre de arcade da Sega e adaptado para inúmeras consolas e PC, ‘Golden Axe’ é um side-scrolling (o jogador vai abrindo caminho andando para a direita) e um beat ’em up (dando pancada nos seus inimigos), podendo ser jogado individualmente ou com dois jogadores em cooperação, na maioria das versões. Para além de poder golpear com a arma, saltar e efectuar um movimento especial para derrubar adversários, também é possível invocar e libertar magia, através de pequenas garrafas recolhidas ao longo dos níveis. Makoto Uchida foi o designer principal do jogo original e teve como influências, para além de filmes de acção do referido Conan, os jogos ‘Double Dragon’ e ‘Dragon Quest’, combinando a jogabilidade do primeiro com a temática do segundo. ‘Golden Axe’ teria duas sequelas: ‘Golden Axe II’, de 1991, um exclusivo para a Mega Drive/Genesis e possivelmente apressado para servir a guerra das consolas contra a Super NES da Nintendo, e ‘Golden Axe III’, de 1993, um título que trouxe novos personagens e um sistema de poder escolher a direcção de caminho a seguir mas que representou um retrocesso no que diz respeito à qualidade dos gráficos e do jogo em geral, tendo até ficado de fora do lançamento no mercado norte-americano. Para além destes dois títulos, uma sequela exclusiva para arcade e vários spin-offs foram ainda lançados, todos sem o grande sucesso do original.

Talvez por apreciar esta temática meio medieval de pancadaria com espadas e afins, este sempre foi o meu jogo preferido de luta em progressão, especialmente com dois jogadores. Tendo jogado primeiro em arcade e depois a versão compreensivelmente mais fraquinha no ZX Spectrum (pelo menos dava para jogar a 2, ao contrário da versão da Master System, por exemplo) foi depois na Mega Drive que mais disfrutei. ‘Golden Axe’ ficou na história como uma das melhores conversões de sempre de um título arcade para uma consola. Gráficos, som e jogabilidade a não ficarem atrás. A versão para Mega Drive inclui ainda um nível adicional dentro do próprio castelo, após salvar o Rei e a sua filha, com um boss final com o nome pouco imaginativo de Death Bringer. Tendo jogado com irmãos, primos e amigos há décadas atrás e ao longo do tempo, mostrando depois o jogo aos mais novos da família, é interessante conferir que o jogo envelheceu relativamente bem e ainda consegue divertir quem o descobre nestes dias.