80’s Bits XX

Um artigo de Ricardo Tarré Gomes

Neste mês em que nos preparamos para passar da emergência à calamidade: Conan e os desalinhados em busca do corno perdido; um acrónimo e palíndromo continuam a conquistar seguidores desde Waterloo e um jogo de tiros com dois nomes diferentes só para ser do Contra.

Filme: ‘Conan o Destruidor’ — Conan the Destroyer — (1984)

O guerreiro cimério Conan (Arnold Schwarzenegger) e o seu parceiro Malak (Tracey Walter) são contactados pela rainha Taramis de Shadizar e aceitam cumprir duas tarefas: roubar uma jóia mística ao mago Toth-Amon, que só pode ser tocada pela princesa virgem Jehnna (Olivia d’Abo), e recuperar um chifre mágico capaz de despertar Dagoth, deus dos sonhos. Como prémio, Taramis garante a Conan ser capaz de ressuscitar a sua falecida amada, Valeria. Para a jornada, além de Malak e Jehnna, Conan é obrigado a levar com ele Bombaata (Wilt Chamberlain), capitão da guarda da rainha, que será o guarda-costas de Jehnna. Para reforçar a equipa, Conan vai ao encontro do mago Akiro (Mako), resgatando-o de canibais, e aceita que se junte a eles a selvagem guerreira chamada Zula (Grace Jones). Mas o que o poderoso bárbaro desconhece é que Taramis ordenou que, após a missão cumprida, Conan seja morto e a virginal princesa retorne para então ser sacrificada ao deus maligno Dagoth.

Após o sucesso de ‘Conan o Bárbaro’ em 1982, que, entre outros reconhecimentos, foi responsável pelo definitivo lançamento da carreira de Arnold Schwarzenegger em Hollywood, a vontade de expandir as aventuras da personagem tornou-se clara para a Universal Pictures. Face à indisponibilidade do realizador John Milius em dirigir a sequela, o prolífico produtor Dino De Laurentiis sugeriu aos estúdios o nome de Richard Fleischer e que o cineasta norte-americano adoptasse um tom menos violento em comparação ao primeiro filme, pelo menos graficamente, de forma a garantir uma classificação que permitisse que mais pessoas pudessem ver a película nas salas de cinema. A decisão de amenizar a violência e até de incluir algumas tiradas mais humorísticas desagradou ao próprio Schwarzenegger que, ainda sem o poder de influência que viria a ter futuramente, não teve outro remédio senão a acatar. O “piscar de olho” ao grande público tornou-se evidente na escolha do elenco, com o recrutamento de figuras populares sem grande experiência de representação como a ex-estrela da NBA Wilt Chamberlain, a modelo e cantora Grace Jones ou mesmo uma das primeiras figuras do wrestling, André the Giant, na pele de Dagoth.

Os resultados de bilheteira foram bons, por pouco não alcançando níveis que caracterizam um blockbuster, mas a crítica não se mostrou tão entusiasmada. Schwarzenegger, Fleischer e De Laurentiis voltariam a juntar forças no ano seguinte em ‘Red Sonja’, filme protagonizado pela actriz dinamarquesa Brigitte Nielsen mas por cá traduzido como ‘Kalidor: A Lenda do Talismã’. A bizarra tradução, que ignora a própria figura feminina principal, em favor da personagem secundária de Schwarzenegger, é sintomática da crescente importância da presença do actor austríaco, num filme que se revelou bastante fraco. Kalidor era suposto ser Conan mas não foi possível chegar a um acordo relativamente aos direitos da personagem criada em 1932 por Robert E. Howard. A mesma teria regresso marcado para 1987 para fechar a trilogia com ‘Conan o Conquistador’ mas tal nunca veio a realizar-se. Ao invés disso, foi feita uma nova versão de ‘Conan, o Bárbaro’, em 2011, com Jason Momoa a empunhar a espada sem grande sucesso. Schwarzenegger ainda não desistiu de voltar a interpretar a personagem e continua com um projecto ligado à mesma na sua lista da IMDB mas veremos se ainda volta à luta.

‘Conan o Destruidor’ foi um dos primeiros filmes que vi numa cassete de vídeo, ainda antes de ter passado na televisão. O meu pai trouxe uma cópia alugada de um videoclube situado no antigo centro comercial Imaviz e as memórias ficaram para sempre. Várias cenas e sons ainda estavam bem presentes quando revi o filme nestes dias, nomeadamente a sequência dos espelhos e a batalha com a besta de capa vermelha, o monstro com o corno de Dagoth, os gritos da princesa a chamar por Bombaata ou até as caretas de Zula em batalha. Tudo isto acompanhado pela excelente composição musical de Basil Poledouris, a dar um toque épico à aventura. Assim se explica o “carinho” por este filme e a presença nesta rubrica em detrimento do original, que tinha gravado em VHS mas do qual não retinha grandes memórias com excepção da cena final. ‘Conan o Bárbaro’ é um filme superior em muitos sentidos, começando pela sólida realização de John Milius, argumento do próprio e de Oliver Stone, actuações de grandes nomes como James Earl Jones e Max von Sydow e todo um tom mais sério e adequado à mitologia de Conan. No entanto, a sequela acaba por servir como bom entretenimento, com toda a epopeia daquele grupo heterogéneo e disfuncional de estranhas personagens a conseguir agarrar a atenção do espectador até ao fim.

Música: ‘Super Trouper’ — ABBA (1980)

Quem nunca ouviu falar dos ABBA? E que banda é esta, oficiosamente retirada desde 1982, que continua tão “viva” nas rádios, nos cinemas e nos teatros por todo o mundo? Composta por Agnetha Fältskog, Björn Ulvaeus, Benny Andersson e Anni-Frid Lyngstad, a banda sueca teve a sua origem na agregação dos dois casais e começou por ter outras designações até se decidir, em 1973, pelo acrónimo das primeiras letras dos nomes de cada dos seus membros. Os ABBA teriam o seu primeiro grande sucesso internacional no ano seguinte com ‘Waterloo’, tema com que venceriam o Festival da Eurovisão. Agenciado por Stig Anderson, que também foi co-responsável por muitas letras das suas canções mais conhecidas, o quarteto nórdico arrancaria para uma carreira que alcançaria os píncaros de superestrelato. Com o impressionante número de 73 singles lançados, incluindo êxitos mundiais como ‘Dancing Queen’, ‘Fernando’ ou ‘Mamma Mia’, e vendas estimadas de 380 milhões de discos, os ABBA conquistaram definitivamente o seu lugar na “realeza” pop.

Em 1980, a banda apresentou ‘Super Trouper’, o seu sétimo trabalho de originais e penúltimo da carreira. Tornou-se o álbum mais vendido desse ano no Reino Unido e deu origem a sete singles, com destaque para a faixa homónima e para ‘The Winner Takes It All’. ‘Super Trouper’, a canção, alcançou o topo das tabelas um pouco por toda a Europa e deve o seu nome a um tipo específico (e patenteado) de holofote geralmente utilizado em grandes arenas e estádios. Escrita por Andersson e Ulvaeus e cantada principalmente por “Frida” Lyngstad, a música foi a última a ser gravada para o álbum e representou também a derradeira vez que um single dos ABBA alcançaria o número um nas tabelas britânicas. A rodagem do videoclipe ficou encarregue, como em muitas outras ocasiões, a Lasse Hallström, cineasta sueco que viria a realizar filmes como ‘Chocolate’ (2000) ou ‘Hachiko — Amigo para Sempre’, de 2009.

Entre tantas músicas conhecidas dos ABBA, ‘Super Trouper’ sempre foi a minha favorita. A razão poderá estar no meu subconsciente. Conta-me o meu irmão do meio que essa era a canção que mais gostava de ouvir em bebé, enquanto a minha mãe me dava a papa a comer. São frequentes os estudos científicos que revelam que só é possível começar a armazenar memórias por volta dos três anos e a verdade é que não me lembro dessa situação mas talvez algo tivesse ficado “gravado” na mente. Também poderão ser recordações de ouvir essa cassete um ou dois anos mais tarde, enquanto a fita durou lá por casa. Admiro os ABBA pelo seu sucesso e pelo facto de terem conseguido cativar as novas gerações, principalmente através do musical ‘Mamma Mia!’, que continua, desde 1999, em exibição no West End de Londres e que já deu origem a dois filmes, ambos bem-sucedidos nas bilheteiras. O que mais esperar do primeiro grupo da história da música, proveniente de um país de língua não inglesa, a atingir consistente sucesso nas tabelas de vendas de Reino Unido, Austrália e Estados Unidos da América? O vencedor leva tudo.

Videojogo: ‘Contra’ (1987)

No longínquo ano de 2633, a maligna organização Red Falcon montou uma base no arquipélago de Galuga, perto da Nova Zelândia, com o plano de eliminar toda a humanidade. Bill Rizer e Lance Bean, dois comandos da unidade de elite Earth Marine Corps Contra, são enviados para a ilha com o objectivo de destruir as forças inimigas e desvendar a verdadeira natureza da entidade alienígena em controlo. Esta é a premissa de ‘Contra’, jogo que a Konami desenvolveu e lançou para as máquinas de arcade em 1987.

O título cedo ganhou popularidade entre os visitantes de salões de jogos muito pela modalidade suportada de dois jogadores em simultâneo, algo pouco habitual até então em jogos de tiros e plataformas. ‘Contra’ apresenta uma variedade de perspectivas, desde a clássica lateral, uma “pseudo” vista em 3D e até uma perspectiva fixa. Nos níveis de panorama lateral, cada jogador pode correr, saltar, baixar-se, mudar de plataforma e disparar em qualquer das oito direcções do joystick, o que proporciona uma notável liberdade de movimentos e acções. Ao longo dos sete níveis é também possível obter outras armas com maior poder de fogo, que o jogador perderá se entretanto for alvejado. E neste ponto reside o maior problema do jogo, a sua dificuldade elevada em sobreviver a um inferno de balas disparadas na nossa direcção.

O sucesso de ‘Contra’ levou a que a Ocean Software, sob licença da Konami, produzisse versões no ano seguinte para o Commodore 64, Amstrad CPC e ZX Spectrum. Renomeado ‘Gryzor’ para o mercado europeu, o jogo era em tudo idêntico em termos de mecânica e jogabilidade em relação ao original de arcade e foi também bem recebido. A portabilidade mais famosa seria a lançada para a Nintendo Entertainment System (NES), tornando-se num título muito popular (especialmente jogado a dois) na emergente “guerra de consolas” com a rival Sega. Esta versão também ficaria conhecida por ajudar a popularizar o uso do Konami Code (↑↑↓↓←→←→BA), um código secreto de “batota” utilizável em vários jogos e que, neste caso, atribuía ao personagem 30 vidas adicionais para ajudar a completar o difícil desafio. No meu caso, desconhecia tal código e se o mesmo funcionaria na versão para Spectrum que tinha em casa. Seja ‘Contra’ ou ‘Gryzor’, a franquia da Konami já leva 11 jogos até ao momento e há inclusive notícias que referem a intenção por parte de uma produtora de cinema chinesa em levar o título ao grande ecrã. Verdade ou… contra-informação?