Análise a ‘A Morte de Estaline’

Baseado na graphic novel homónima de Fabien Nury e Thierry Robin, ‘A Morte de Estaline’ é o mais recente trabalho do britânico Armando Iannucci. Conhecido principalmente como criador e argumentista da série americana ‘Veep’, Iannucci mergulha, uma vez mais, na área da sátira política, por onde tem conduzido a maior parte da sua carreira com distinção.

O filme acompanha as últimas horas de vida do ditador soviético Josef Estaline, o momento da sua morte e a posterior luta interna pelo poder para encontrar o novo secretário-geral da URSS. Entre as figuras-chave do regime em rota de colisão estão o vice-presidente Georgy Malenkov, (Jeffrey Tambor) o chefe dos serviços secretos Lavrenti Beria (Simon Russell Beale) e o político Nikita Khrushchev (Steve Buscemi).

Um regime totalitário e uma nação petrificada pelo medo. Lista com nomes de cidadãos indicados para detenção e execução. A morte e o funeral do chefe de estado. Um clima de intriga e conspiração entre as altas figuras do comité soviético com vista à sucessão. Tudo isto foram factos verídicos e seriam óptimos “ingredientes” para “cozinhar” um drama histórico ou mesmo um thriller mas Armando Iannucci faz exactamente o contrário. O realizador, e aqui igualmente argumentista, desconstrói por completo todas estas personagens históricas e dá-lhes um carácter cómico e até apatetado, resultando em diálogos e situações por vezes hilariantes entre eles.

Apesar de minimamente respeitar esses factos verídicos, não há a intenção de Iannucci de retractar fielmente a época nem tão pouco de minimizar as atrocidades do regime de Estaline, uma vez que é descaradamente intencionada a vontade de apresentar uma sátira política sobre os bastidores da sucessão do chefe de estado soviético. O realizador fez, inclusive, questão que os actores não adoptassem um sotaque ou entoação russa nos seus diálogos, para que pudessem mais livremente improvisar algumas das suas falas, que são claramente um ponto forte desta comédia negra. O tom humorístico e satírico vai alternando por vezes de forma desenquadrada com situações ou cenas de brutal violência e é neste ponto que o filme, por vezes, perde brilhantismo, especialmente mais perto do seu final.

Steve Buscemi, com a sua representação do engenhoso Khrushchev, lidera um elenco de grande qualidade que, para além do já referido Tambor, também conta com Rupert Friend, Andrea Riseborough, Jason Isaacs e Michael Palin. Destaque para a boa actuação de Simon Russell Beale, um actor com uma carreira discreta e algo esporádica no cinema mas uma das mais aclamadas figuras do teatro britânico.

‘A Morte de Estaline’ representa mais uma interessante incursão de Armando Iannucci pela sátira política e é, no global, bem-sucedido no seu propósito. Como curiosidade, refira-se que a acutilância do olhar de Iannucci valeu a que o filme fosse proibido na Rússia e em alguns outros países do antigo bloco soviético.