Análise a ‘O Predador’

O Predador está de volta, depois de três filmes a caçar humanos e ainda outros dois spin-offs enfrentando a também raça alienígena da saga ‘Alien’. O que seria, inicialmente, um reboot de todo o universo e mitologia em torno desta personagem icónica, apresentada originalmente em ‘Predador’ de John McTiernan de 1987, acabou por resultar em mais uma espécie de “reinvenção” que reconhece e menciona eventos passados nos anteriores filmes mas que tenta dar um novo rumo a esta saga.

Quinn McKenna (Boyd Holbrook) é um ex-militar a soldo que avista a chegada de um predador alienígena numa selva mexicana e consegue apoderar-se de alguns artefactos tecnológicos deste. Procede ao envio, por correio, dos mesmos para casa e é o seu filho Rory (Jacob Tremblay) que os recebe, acabando por, acidentalmente, emitir um sinal de localização para que uma versão mais avançada destes caçadores letais do universo seja enviada para o nosso planeta. Eles estão mais fortes, mais inteligentes e mais mortais que nunca, aperfeiçoados geneticamente com o ADN de outras espécies. A partir desse momento, só McKenna, um grupo disfuncional de ex-soldados e uma entusiástica bióloga (Olivia Munn) pode impedir o fim da raça humana.

Foi grande a expectativa gerada pela revelação de que Shane Black iria realizar e escrever o novo filme da saga ‘Predador’, resultando no seu regresso ao franchise depois de ter sido Hawkins, um dos personagens do filme original. Black é também um argumentista com créditos firmados (‘Arma Mortífera’, ‘Bons Rapazes’) e a sua ideia de revitalizar a saga depois do mediano ‘Predadores’ de 2010 era bem-vinda. Infelizmente, o tiro saiu pela culatra. O estilo do realizador americano está bem presente e é identificável no ritmo frenético das sequências de acção e como combina esta com apontamentos cómicos mas é aqui precisamente que reside o maior problema. Em alguns momentos fica a sensação de que ‘O Predador’ é uma comédia (e das más) pela quantidade excessiva de cenas com tiradas galhofeiras entre as personagens (especialmente por parte dos ex-militares, um grupo de homens a sofrer de stress pós-traumático e em que um deles também sofre de síndrome de Tourette — que conveniente para efeitos cómicos…), a patetice de alguns intervenientes (a bióloga que atinge o próprio pé com uma arma de tranquilizantes) e mesmo o caricato chega à personagem do “super predador “, que aparece acompanhado de “cães predadores” (com rastas também e que, pelos vistos, se comportam exactamente como cães humanos). Algumas piadas atingem o alvo, é certo, mas a meio do filme já são mais os revirar de olhos do que as gargalhadas.

Shane Black desenvolveu o argumento em parceria com Fred Dekker (conhecido pelo péssimo RoboCop 3, que acabou com a sua opção de carreira como realizador) e ambos tiveram que reescrever completamente todo o terceiro acto e clímax do filme. A principal razão prende-se com a má recepção que o filme teve nas visualizações de teste, prática habitual dos grandes estúdios de Hollywood para aferir a reacção de um público restrito ao produto final, antes de dar por concluídas as filmagens. Circulam rumores também que a cena final incluiria um cameo de Arnold Schwarzenegger (o Dutch do filme original) mas que o mesmo recusou e, assim, “furou” as expectativas dos argumentistas após ler o pouco que Black e Dekker haviam escrito para si. A realidade é o que o filme não funciona como um todo e essa mesma parte final que foi refilmada destaca-se por falhas no argumento, na montagem e até na continuidade de algumas cenas.

O elenco está recheado de actores facilmente reconhecíveis de outros trabalhos como Holbrook (da série ‘Narcos’ ou ‘Logan’), Munn (‘X-Men: Apocalypse’), Thomas Jane (‘Punisher’) ou Alfie Allen (‘A Guerra dos Tronos’), tendo os seus desempenhos prejudicados, em alguns casos, pelas ridículas linhas de diálogo atribuídas ou por fraco desenvolvimento das personagens. A bióloga Casey Brackett, por exemplo, passa de uma curiosa professora para uma heroína de acção num piscar de olhos, manuseando armas de fogo e saltando para cima de autocarros em andamento como se fosse “mais um dia no escritório”. Destaca-se o pouco tempo de ecrã do excelente Sterling K. Brown (da série ‘This Is Us’) e a interessante prestação do pequeno Jacob Tremblay (‘Wonder — Encantador’) no papel do menino autista que, aparentemente, é fluente em comunicação e tecnologia alienígena…

‘O Predador’ não é o regresso esperado mas até pode significar o retomar da saga nos próximos tempos, pela forma desenvergonhada como pisca o olho a uma sequela na cena derradeira. Apesar do insatisfatório produto final, compreende-se a boa intenção de Black em tentar emular o clássico de 1987, incluindo um grupo heterogéneo de militares e a decorrente camaradagem, sequências de acção intensas e com muita violência e gore à mistura e o uso da música de Henry Jackman que respeita o marcante trecho original de Alan Silvestri. No entanto, o filme simplesmente não resulta, apesar de toda a mitologia que tinha ao seu dispor para explorar. Seja por não ter um protagonista à altura como o era Schwarzenegger, um argumento sólido ou simplesmente por não conseguir equilibrar e equiparar acção, ficção científica e comédia quando esta última deveria apenas ser usada em doses moderadas, algo aconteceu. Como diria Mike Harrigan em ‘Predador 2’: “ shit happens “…