Análise a ‘Um Lugar Silencioso’

A terceira experiência como realizador por parte de John Krasinski, o “eterno” Jim Halpert da versão americana da série ‘The Office’, resulta num thriller de terror em que o silêncio é um elemento narrativo fundamental. A contribuição de Krasinski estende-se também ao argumento, juntamente com Bryan Woods e Scott Beck, e como actor principal, partilhando o protagonismo à frente das câmaras com a sua esposa na vida real, Emily Blunt.

‘Se te ouvem, caçam-te’. Este é o mote do filme, situado num futuro não muito distante e que segue uma família que vive meticulosamente em silêncio, ameaçada pela existência de enigmáticas criaturas que caçam qualquer ser através do som. Sem poder contar com mais ninguém, no que parece ser uma catástrofe à escala global, Lee (Krasinski), Evelyn (Blunt) e os seus filhos seguem uma apertada disciplina comportamental e terão que se manter unidos e descobrir forma de sobreviver e contrariar esta misteriosa ameaça mortal.

O recente sucesso de ‘Foge’, de Jordan Peele, que funcionou como uma espécie de revitalização do interesse do grande público em filmes de terror, parece ter aberto o caminho para que ‘Um Lugar Silencioso’ continue essa tendência. Apesar da existência de alguns lugares-comuns próprios do género, o filme de Krasinski reveste-se de uma originalidade assinalável na forma como mantém o espectador por vezes até desconfortável mas extremamente focado no que se passa no ecrã. O silêncio sempre foi uma arma hábil para oferecer tensão, especialmente nos terrenos do horror, e aqui é usado com mestria desde que nos são dadas a conhecer as personagens até ao final do intenso terceiro acto.

O acompanhamento da adaptação da família Abbott a este mundo pós-apocalíptico, através da forma como se move e dialoga maioritariamente em silêncio e através de linguagem gestual, também carece da nossa própria adaptação como espectadores. Uma vez bem-sucedida, a sensação de imersão é muito presente, embora possa ser algo arruinada se for vista em sala de cinema que não respeite devidamente o silêncio. Como diz o provérbio, “a palavra é de prata, o silêncio é de ouro”.

Emily Blunt tem uma actuação impressionante como a “mãe coragem” desta acossada família, acompanhada por um sólido Krasinski e com bons desempenhos por parte dos jovens Noah Jupe e, principalmente, Millicent Simmonds. A boa exploração da dinâmica entre as personagens permite que as consideremos credíveis e é sentida a “química” familiar.

‘Um Lugar Silencioso’ não atingirá o estatuto de obra-prima e tem as suas falhas de plausibilidade na lógica narrativa que nos oferece mas, ainda assim, possui tudo para ser considerado um dos melhores filmes de terror do ano. Tal como o filme de Peele, consegue surpreender pela sua abordagem menos convencional a um género que se tem mostrado pouco fulgurante nos últimos tempos. Pode até parecer injusto para John Krasinski, que assina um bom filme, mas não podemos deixar de pensar até onde poderia ir outro realizador mais experiente com este material.