As Crónicas do J-Horror: Episódio XVII — ‘The Samejima Incident’ (Motelx 2021)

★★★☆☆

No dia de abertura do Motelx 2021, foi exibido ‘The Samejima Incident’, um filme de Jirô Nagae.

Baseado na lenda urbana da Internet do Japão, o novo filme de Jirô Nagae (Kokkuri-san: Gekijoban; Sukima Omna) pega no conceito do ‘Incidente de Samejima’ e aplica-o no âmbito da atual pandemia, com uma reunião anual entre Nana Sasaki (Takeda Rena) e os seus ex-colegas a acontecer online pela primeira vez.

Uma das participantes, Ayumi, não aparece na mesma, o que preocupa Yuki e Suzu, pois a primeira já havia começado a exibir comportamentos estranhos desde que visitaram um prédio abandonado, onde teria ocorrido um incidente atroz intitulado de ‘Incidente de Samejima’. Ao confessarem, ambos revelam que a lenda começou a circular na Internet anos antes, e que a verdade não era de conhecimento público, pois aqueles que a descobrissem ficariam amaldiçoados e morreriam.

Após o facto, não demora muito até Ayumi ser avistada morta a partir da sua webcam, sendo esse o primeiro de uma série de acontecimentos sobrenaturais e aterradores que colocarão a vida de todos os participantes em risco.

Jirô Nagae inspira-se claramente em clássicos do terror, particularmente no J-Horror, abrindo o filme com um flashback de um assassinato cuja montagem, banda sonora, e fotografia relembra imediatamente o Ju-On de Takashi Shimizu. Como se não fosse o suficiente, de seguida avistamos Nana dentro de um elevador a subir para o seu apartamento enquanto a imagem aterradora de Samejima se revela em cada andar que sobe, uma característica notória do mesmo clássico. Estas pequenas inspirações são recorrentes ao longo do filme, que entrelaça diversos elementos vistos em Ju On, Ring, e Noroi The Curse, este último mais preciso na vertente found footage que trás a ‘Samejima’ os seus melhores jump scares. Muitas das técnicas cinematográficas de clássicos J-Horror são utilizadas aqui, e Jirô Nagae sabe executá-las com precisão.

Outra inspiração passa pela própria pandemia que vivemos, em que o coronavírus é usado como uma espécie de metáfora para a maldição de Samejima, e pelo modo como a pandemia inspirou o argumento, que evita ao máximo contactos físicos entre os atores — The Samejima Incident é um filme que leva muito a sério o conceito de distanciamento social.

Toda a história desenrola-se à noite em cenários escuros, fechados e aterradores, num contexto em que não nos quereríamos apanhar sozinhos, e traz todas as vibes de um puro J-Horror assombrado, com cores, atmosfera, suspense, e uma aplicação de som que nos arrepiam recorrentemente.

O conceito de ‘The Samejima Incident’ acaba por transformar a obra num puzzle interessante, onde Jirô Nagae sabe o que quer e não perde tempo nenhum em ir direto ao assunto, evitando marinar na narrativa, algo que definitivamente o ajuda a manter um ritmo de filme equilibrado. No entanto, esta longa-metragem não vem sem alguns pontos menos positivos.

Ao tentar pôr em prática tudo o que resultou nos grandes clássicos que o inspiram, Jirô Nagae acaba por subcarregar a sua própria narrativa, com algumas das revelações-chave a surgirem com pouca ou nenhuma explicação, e a urgência em manter o filme num ponto alto de medo faz com que o mesmo recorra muitas vezes às mesmas técnicas de transmitir o terror, nomeadamente com a maldição de Samejima a aparecer constantemente atrás de Nana e das outras personagens, nas extremidades do plano.

Aqui, nota-se que Nagae tem dificuldade em manter o terror no seu auge, e ao repetir-se demasiado não deixamos de sentir alguma falta de identidade própria e inovação em The Samejima Incident, salvo em uma cena que não será aqui revelada para efeito de surpresa.

De qualquer forma, é um filme bem realizado, que centra a ação maioritariamente em grandes planos, economiza ao máximo os seus recursos (como a pandemia obriga), e tem uma montagem cuidada, que alterna a ação entre planos na terceira pessoa e planos em primeira pessoa.

Não é um filme revolucionário, mas com a ideia e argumento certo, Jirô Nagae tem tudo ao seu alcance para criar grandes obras de terror.