Esta análise contém dois pontos de vista diferentes, o ponto de vista de quem viu todas as temporadas anteriores (Tiago Rafael), e o ponto de vista de quem só ainda viu esta temporada (Susana Lima). Iremos falar no plural sempre que ambos os pontos de vista forem iguais.
Tiago Rafael:
Nesta temporada o episódio que mais gostei foram o 1, e o episódio que menos gostei foi o 4, o episódio 3 segue muito perto atrás do primeiro,no entanto, a diferença é apenas o gosto pessoal pelo estilo de episódio e pela sua estória. Os episódio 2 e 5 achei que pouco tinha a ver com Black Mirror, apesar de serem episódios decentes.
Susana Lima:
Fui introduzida a esta série através de um amigo que me explicou que a nível narrativo esta série era pesada, que os temas recorrentes eram algo que nos faziam questionar a nossa ética, moral e ideais. Sendo eu uma pessoa com um fascínio enorme por psicologia e filosofia...e com um amor enorme por narrativas complexas...decidi ver esta temporada para matar a minha curiosidade. Confirmei que realmente Black Mirror tem tendência para narrativas mais pesadas e complexas, no entanto não é algo que aconteça em todos os episódios. Nesta temporada os episódios aos quais eu mais gostei foram o 1 e 3, e o episódio que menos gostei foi o 4, ficando assim os episódios 2 e 5 como episódios com uma narrativa já existente no mundo do cinema e que não me fizeram "ficar de boca aberta".
Ambos achamos que a cotação para esta temporada é de 3 estrelas (★★★).
Fica abaixo a análise dos episódios um a um com a cotação de cada um.
Episódio 1: "Joan Is Awful" ★★★★★
Tiago Rafael:
Uma estória clássica de Black Mirror, ao início parece tudo normal até chegar ao ponto da reviravolta onde o rumo do episódio muda por completo, a personagem principal é confrontada com a realidade e começa a perder a cabeça, levando ao segundo plot twist que é ainda mais surpreendente, no entanto, o final deste episódio é tão alegre que nem pareceu um final de Black Mirror. Este episódio mostra a importância de ler os "termos e condições" e as suas consequências.
Susana Lima:
Para além do que o Tiago falou acima, gostaria de adicionar mais pontos de vista. Este episódio fez-me lembrar algo que Arthur Schopenhauer disse no seu livro O Mundo Como Vontade e Representação, que passo a citar..."O animal comunica as suas sensações e o seu humor através de movimentos e de gritos; o ser humano desvenda ou esconde do outro os seus pensamentos com a ajuda da linguagem."...com isto percebemos que é algo normal para os humanos não dizem totalmente as coisas como elas são (por medo das consequências, seja para não magoar pessoas ou porque não é politicamente correto). Algo que podemos também entender deste episódio é como todos os discursos, ao passarem de boca em boca, acabam distorcidos mais e mais até que a "verdade" se perde no envio dessa mensagem.
Episódio 2: "Loch Henry" ★★★
Um episódio um pouco diferente da fórmula Black Mirror, no sentido que não temos as consequências de uma tecnologia que poderá estar presente no nosso futuro próximo, mas sim as consequências das ações humanas. Este episódio mostra o quão pouco podemos conhecer do passado das pessoas e como por vezes desenterrar esse passado pode ter mais desvantagens que vantagens. O final pode ser resumido a uma pergunta retórica "Consegui tudo o que queria, mas a que custo?".
Episódio 3: "Beyond the Sea" ★★★★★
A estória de como uma tragédia pode afetar o psicológico de alguém ao ponto de a levar a fazer algo impensável. Neste episódio temos dois astronautas que, durante uma missão ao espaço, conseguem estar também presentes no mundo com suas famílias, no entanto, devido a razões morais, acontece uma tragédia que muda a vida destes homens. Quando deparado com a solidão, um deles começa a perder a noção da realidade e acaba por fazer o companheiro perder tudo. É um episódio que nos questiona sobre morais, o que está certo e errado, e de como a solidão pode afetar as pessoas.
Episódio 4: "Mazey Day" ★★
Um episódio muito fora do que é Black Mirror, tendendo mais para outro lado sem ser a tecnologia. No entanto, este episódio retrata, de forma exagerada, o quão mau são os paparazzi para os artistas. Outro tema deste episódio é a culpa que é sentida devido a más ações feitas, esta culpa que pode consumir a pessoa, neste episódio, literalmente. Uma pequena lição no inicio do episódio é que tenham cuidado com drogas. Uma estória um pouco mais fraca, também por estar habituado ao clássico duplo twist de Black Mirror, mas aqui o único twist foi fraco e não teve um grande impacto.
Episódio 5: "Demon 79" ★★★
Tiago Rafael:
Para acabar esta temporada, outro episódio que se desvia da fórmula, outra vez sem ser sobre as preocupações que trazem o avanço da tecnologia, mas sobre um tema mais fantástico. É possível ver uma referência a um episódio passado, o que dá a entender que todo o universo Black Mirror pode ser entendido como uma linha temporal que, devido a alterações no passado, tenha diferentes desenlaces no futuro, levando aos variados episódios.
Susana Lima:
Este episódio fez-me lembrar imediatamente de Knock at the Cabin de M. Night Shyamalan, por terem a mesma ideia central. Posto isto fiquei um pouco "indiferente" com este episódio. Para quem está habituado a filmes de terror clássicos consegue perceber algumas referências a nivel de imagem e som.
Conclusão:
Tiago Rafael:
Esta é uma temporada um pouco atípica, são retratados outros temas além do avanço da tecnologia. É possível ver que todos os episódios retratam maioritariamente a saúde mental dos protagonistas e o seu desenvolvimento durante o episódio. Se nas temporadas passadas Black Mirror instigava pensamentos de moralidade e a ética da tecnologia, agora vê-se um pensamento mais abstrato dos problemas que se passam dentro da cabeça dos humanos e as consequências que traz.
São bons episódios com excelentes performances e realizações, mas três dos episódios não aparentam ter a essência de Black Mirror, são mais focados noutros assuntos. Estes assuntos são oportunos (para quem os entender), contudo, é visível um declínio na qualidade das estórias criadas, algo já aparente na temporada anterior.
Susana Lima:
Mesmo tendo alguns episódios "pouco originais", continuo a achar que esta série tem potêncial e que pôe muitas questões no ar. Num mundo em que mais e mais pessoas deixam de se questionar sobre assuntos importantes, este tipo de conteudos acabam por nos forçar a "puxar pela cabeça" de maneira mais leve e divertida.
Não é algo que aconcelharia a adolescentes abaixo dos 14 anos tendo em conta a sua complexidade.