Total 90s — II

Nesta segunda edição: Arnie disse que voltaria e cumpriu a palavra, regressando com outros modos; uma dose dupla de uma banda a bater à porta do céu com uma atitude infernal e um ouriço supersónico simpático mas muito senhor dos seus anéis.

Filme: ‘Exterminador Implacável 2: O Dia do Julgamento’ — Terminator 2: Judgment Day — (1991)

Passaram-se mais de 10 anos desde que a primeira máquina identificada como ‘Exterminador’ tentou assassinar Sarah Connor (Linda Hamilton) antes que pudesse dar à luz John (Edward Furlong), o futuro líder da resistência, agora um jovem e saudável rapaz. Porém, o pesadelo recomeça quando um novo e mais avançado exterminador, modelo T-1000 (Robert Patrick) é enviado do futuro pelo sistema de inteligência artificial Skynet. As suas ordens: eliminar John Connor enquanto este é ainda uma criança. Contudo, Sarah e John não terão de enfrentar sozinhos este terrível exterminador. A resistência humana enviou um outro guerreiro do futuro, um reprogramado T-800 (Arnold Schwarzenegger) e as suas ordens são proteger John Connor a todo o custo, enquanto Sarah procura evitar o acontecimento futuro conhecido como “dia do julgamento”.

Após ter apostado tudo no sucesso de ‘O Exterminador Implacável’ em 1984 e de ter tido as bilheteiras e crítica a proporcionarem-lhe o devido reconhecimento, James Cameron começou a pensar numa sequela, em tudo maior que o original. No entanto, poucos avanços de produção se registariam no resto da década, principalmente devido a duas razões: a disputa legal pelos direitos da franquia e as limitações técnicas no que diz respeito a imagens geradas por computador. O primeiro entrave foi ultrapassado com a compra da Hemdale Film Corporation por parte da Carolco Pictures em 1990 e, quanto ao segundo, o tempo acabou por proporcionar finalmente a Cameron as ferramentas necessárias para pôr em prática os efeitos pensados para dar vida ao T-1000 no grande ecrã. De 1984 a 1991 a evolução técnica a níveis dos efeitos especiais foi evidente e o realizador norte-americano tirou partido dos novos recursos disponíveis, tal como o viria a fazer quase duas décadas mais tarde com ‘Avatar’ (2009), outro dos seus trabalhos reconhecido pela inovação tecnológica e visual.

Arnold Schwarzenegger e Linda Hamilton regressaram do filme original, com o actor austríaco já com estatuto de superestrela e a actriz norte-americana a apresentar uma notável envergadura física comparativamente ao primeiro filme. O até então pouco conhecido Robert Patrick foi escolhido como vilão e o estreante Edward Furlong seleccionado entre centenas de jovens para o papel de John Connor. Destaque ainda para a presença de Joe Morton na pele de Miles Dyson, o “génio” da Cyberdyne, e Earl Bowen como Dr. Silberman, retomando o papel do filme original. James Cameron escreveu (juntamente com William Wisher), produziu e realizou e viu a sua obra estrear em Los Angeles a 1 de Julho de 1991. ‘Exterminador Implacável 2: O Dia do Julgamento’ atingiu a marca de filme mais caro de sempre na altura, com um orçamento na ordem dos 100 milhões de dólares, mas as suas receitas a nível mundial mais do que compensaram o investimento, quintuplicando esse valor. Arrecadou ainda quatro Óscares da Categoria em duas categorias de som, efeitos especiais e maquilhagem e duas outras nomeações em áreas prestigiantes como fotografia e montagem.

Contrariamente ao primeiro filme, sobre o qual resistiam muitas dúvidas se iria funcionar ou perder-se entre muitos outros de modesta produção do mesmo género, a sua sequela apresentava-se como uma máquina bem oleada. A franquia era um sucesso, Cameron um respeitado realizador (com ‘Aliens — O Recontro Final’ e ‘O Abismo’ já no seu currículo), Schwarzenegger a maior estrela de filmes de acção do momento (após uma série de êxitos, incluindo ‘Predador’ e ‘Desafio Total’) e um teaser trailer realizado por Stan Winston (mostrando uma linha de montagem de exterminadores) lançado um ano antes veio aguçar ainda mais o apetite para o novo filme. Eu tinha 11 anos quando estreou e lembro-me de tentar ir vê-lo com os meus irmãos ao cinema mais próximo de casa mas a sessão estava esgotada. Acabei por assistir ao outro filme em cartaz — ‘Robin Hood — O Príncipe dos Ladrões’, que até gostei, mas fiquei triste por ter perdido a oportunidade de ver no cinema a continuação de um dos meus filmes preferidos de sempre. Assim sendo, a “estreia” para mim veio quando o filme passou na RTP1 uns anos mais tarde e correspondeu completamente às expectativas. James Cameron subiu a fasquia dos filmes de efeitos especiais e das sequências de acção, como é exemplo a memorável cena de perseguição entre camião e moto, entre outras. Recentemente foi óptimo regressar a ‘T2’ e assistir a uma versão especial em Blu-ray contendo cerca de 15 minutos adicionais, incluindo uma sequência de sonho de Sarah com Kyle Reese (Michael Biehn, de regresso ao seu papel do filme original), e com um final alternativo que teria encerrado a franquia bem melhor que qualquer das sequelas produzidas posteriormente, incluindo a última e desapontante ‘Exterminador Implacável: Destino Sombrio’ (2019).

Álbum: ‘Use Your Illusion I/II’ — Guns N’ Roses (1991)

Os anos 80 deram a conhecer ao mundo os Guns N’ Roses com o seu álbum de estreia ‘Appetite for Destruction’ e melhor cartão-de-visita era impossível. Ainda hoje detém o invejado recorde de álbum inaugural de uma banda mais vendido de sempre e muitas das suas canções tornaram-se intemporais. O sucessor ‘G N’ R Lies’ chegaria logo um ano depois, em 1988, mas consistiria basicamente da junção do anterior EP ‘Live ?!*@ Like a Suicide’ com outras quatro canções gravadas com guitarras acústicas, em que se destacaram ‘Patience’ e ‘Used to Love Her’. Seguiram-se mais sucessos de vendas, mais êxitos nas rádios e mais polémicas em concertos, algo que a banda (e especialmente o seu vocalista Axl Rose) nunca fez por evitar. A entrada numa nova década significou também o regresso em força ao estúdio para os Guns N’ Roses e o resultado seria não um mas dois novos álbuns lançados simultaneamente a 17 de Setembro de 1991: ‘Use Your Illusion I’ e ‘Use Your Illusion II’. O lançamento dos álbuns ocorreriam enquanto a banda já se encontrava em digressão, uma das maiores na história do rock, consistindo em 194 concertos espalhados por 27 países.

‘Use Your Illusion I’ atingiu o segundo lugar da tabela de vendas da Billboard e originou os singles ‘Don’t Cry’ (uma power ballad muito popular que foi número um em Portugal), ‘Live and Let Die’ (uma versão de um original de Paul McCartney e da sua banda Wings gravado para a banda sonora do filme ‘007 — Vive e Deixa Morrer’) e ‘November Rain’ (uma épica balada sinfónica de oito minutos e 57 segundos, intercalada com poderosos solos de guitarra de Slash, e que originou um dos videoclipes mais caros da história). Ao longo das 16 canções que compõem o álbum destaca-se também ‘The Garden’ (com a participação especial de Alice Cooper) e ‘Coma’, a faixa mais longa de toda a carreira dos californianos, com a sua duração a exceder os 10 minutos.

‘Use Your Illusion II’ vendeu ainda melhor que o primeiro, ao atingir o lugar cimeiro da Billboard, proporcionando aos Guns N’ Roses o recorde de única banda a ter dois dos seus álbuns nas posições cimeiras da tabela. A explicação para o segundo volume ter alcançado melhores números de vendas pode ser atribuída ao lançamento prévio de três dos seus singles. ‘You Could Be Mine’ integrou a banda sonora de ‘Exterminador Implacável 2: O Dia do Julgamento’, lançada meses antes, e pode ser ouvida numa das primeiras cenas do jovem John Connor e durante os créditos finais. Com a sua vigorosa introdução de bateria e guitarra no primeiro minuto, a canção mereceu um videoclipe original com a presença de Arnold Schwarzenegger na pele de um T-800 que tem como alvo os próprios Guns N’ Roses. O lado B do single de lançamento continha ‘Civil War’, outra das futuras grandes faixas do álbum. Com a particularidade de ter sido a única música em ambos os volumes com a contribuição do baterista original Steven Adler (antes de ter sido despedido pela banda e substituído por Matt Sorum), a poderosa canção anti-guerra é reconhecida pelo discurso inicial de Strother Martin retirado de uma cena do filme ‘O Presidiário’, de 1967. O terceiro single lançado antecipadamente foi ‘Knockin’ on Heaven’s Door’, um original de Bob Dylan datado de 1973 e cuja versão dos Guns N’ Roses foi incluída na banda sonora do filme ‘Dias de Tempestade’, de 1990. ‘Use Your Illusion II’ geraria ainda mais os singles ‘Yesterdays’ e ‘Estranged’ (este lançado mais de dois anos depois da estreia do álbum) e entre as 14 canções no alinhamento destacam-se ainda uma outra versão de ‘Don’t Cry’ com letra diferente da presente no primeiro volume e ‘Get in the Ring’, onde a banda ajusta contas com alguns críticos e com muitos palavrões à mistura.

Após um brilhante álbum de estreia, os Guns N’ Roses deixaram os fãs da sua música com apetite para o que viria a seguir. ‘G N’ R Lies’ não chegou para matar a fome e aguardava-se com expectativa um digno sucessor. Eu incluía-me neste largo grupo e foi com muita satisfação que por volta de 1992 avistei os dois álbuns lá em casa. Um amigo do meu irmão mais velho tinha-lhe emprestado ambos os ‘Use Your Illusion’ em CD e ouvir novamente umas das minhas bandas preferidas com músicas novas foi uma grande satisfação. Gostei imediatamente dos dois álbuns (talvez pendesse um pouco mais para o ‘II’) mas também reconheci (e mantenho essa opinião hoje) que nem todas as canções fossem extraordinárias. Ao contrário de ‘Appetite for Destruction’, cujas 12 faixas encaixam perfeitamente no estilo e espírito do álbum, em 1991 a bandou lançou 30 de uma vez e abordou uma maior variedade de estilos musicais, sendo natural que existam fillers dentro dos dois ‘Illusion’. Antes de devolverem os CD os meus irmãos fizeram cópias de ambos para cassete e através da selecção necessária de faixas gravadas para que ambos coubessem em cada lado, ficámos com dois álbuns muito fortes. Tão fortes que foram a “banda sonora” das férias que passámos nesse ano em Santa Cruz e das quais algumas dessas músicas tocadas num rádio portátil com leitor de cassetes me fazem imediatamente relembrar.

Videojogo: ‘Sonic the Hedgehog’ (1991)

Numa tentativa de roubar as seis Esmeraldas do Caos e aproveitar o seu poder para controlar o mundo, o maléfico Dr. Ivo Robotnik aprisionou os animais da Ilha do Sul dentro de robôs agressivos e de cápsulas metálicas estacionárias. A única esperança é Sonic, um ouriço antropomórfico cujo objectivo é parar os planos de Robotnik, salvando os animais e tentando coleccionar todas as Esmeraldas. O jogador controla a supersónica criatura azul ao longo de seis zonas distintas, cada uma com três actos, amealhando anéis dourados como forma de ganhar vidas adicionais e de evitar perder as já existentes no caso de ataque inimigo ou colisão com armadilhas ou adversários.

Lançada inicialmente no Japão em 1988, na América do Norte (sob o nome ‘Genesis’) no ano seguinte e disponibilizada em 1990 para todo o mundo, a Mega Drive foi a grande aposta da multinacional japonesa Sega na era dos 16 bits e consequente “guerra” com a rival nipónica Nintendo. Após um limitado sucesso com adaptações de jogos de arcade, a Sega pretendia afirmar a sua marca através de uma nova mascote (mais entusiasmante que Alex Kidd) para rivalizar com o já muito popular Mario (da série de jogos ‘Super Mario’ e com presença em muitos outros da Nintendo). A equipa de desenvolvimento começou a trabalhar no assunto e a sugestão de Naoto Ohshima em apresentar um ouriço (que era uma espécie de combinação entre a cabeça do Gato Félix e o corpo do Rato Mickey) foi a eleita. A partir daí avançou-se definitivamente para a criação de um jogo em torno de Sonic, das suas capacidades, dos seus inimigos e de todo o seu mundo. Foi enfatizada uma mecânica de jogo focada na velocidade do novo herói utilizando uma técnica inovadora que permitia ao sprite de Sonic rolar ao longo de um cenário curvo, proveniente de uma demonstração criada pelo programador Yuji Naka.

‘Sonic the Hedgehog’ chegou às lojas no verão de 1991 e foi um êxito tremendo, com os números de 1997 a revelarem um total de 400 milhões de dólares em vendas por todo o mundo (o que é extraordinário comparando com as receitas médias de um filme blockbuster da altura — entre 200 e 300 milhões). A estes valores acrescem os provenientes de mais de 15 milhões de cópias vendidas na versão Mega Drive agrupada com a própria consola, uma importante jogada de marketing que deu um impulso fundamental à afirmação e popularidade da Sega no mercado. ‘Sonic’ impressionou tudo e todos com a sua velocidade (algo sem precedentes para um jogo de plataformas), animações, cores brilhantes, fundos detalhados, efeitos sonoros e até a sua música, composta de forma notável por Masato Nakamura.

Apesar de ‘Sonic the Hedgehog’ ter sido lançado para todas as consolas da Sega, para as máquinas arcade e até mais tarde (pasme-se!) para a Nintendo 3DS, é impossível não associar o jogo à Mega Drive. E no meu caso isso ainda é mais indissociável pois recebi a consola de presente no Natal de 1992 numa edição que continha ‘Sonic’ e a compilação ‘Mega Games’. Se o ZX Spectrum foi o computador mais me marcou, a Mega Drive representou o mesmo em termos de consola e os primeiros meses foram dominados pelo ouriço azul. Cheguei ao fim do jogo mas não me recordo ao certo se o consegui jogando desde o início ou através de uma popular cheat que permitia escolher qual o nível onde começar. Passei o jogo aos meus sobrinhos através de emuladores e versões para novas consolas e o entusiasmo deles ao jogá-lo pela primeira vez foi semelhante ao da minha geração, prova de que ‘Sonic’, prestes a celebrar 30 anos, envelheceu muito bem.