Total 90s — VIII

Neste mês: Jordan leva tudo o que é desafio a peito, inclusive um filme às costas; um “peluche” de grunge que trepou até ao topo das tabelas e um jogo de basquetebol, como diria Carlos Barroca, faaantástico!

Filme: ‘Space Jam’ (1996)

Os famosos Looney Tunes são raptados por um grupo de extraterrestres que julgam que Bugs Bunny, Daffy Duck, Porky Pig e companhia vão conseguir reanimar um parque de diversões que tem sido mal-sucedido no seu planeta. Tentando obter a liberdade, Bugs Bunny propõe aos alienígenas um grande jogo de basquetebol para resolver a questão. O problema é que os Monstars, liderados pelo malévolo Swackhammer, conseguiram roubar os poderes de estrelas da NBA como Charles Barkley, Patrick Ewing e outros, tornando-se uma equipa quase invencível. É então que Bugs Bunny pede ajuda a Michael Jordan, dizendo-lhe que se eles perderem o jogo serão levados como escravos para o planeta dos Monstars. Jordan, que entretanto se tinha retirado do basquetebol e dedicado a jogar basebol, aceita o desafio, embora se sinta destreinado.

Em 1992 e 1993, dois anúncios da Nike no famoso intervalo do Super Bowl apresentaram pela primeira vez uma dupla formada pela personagem de animação Bugs Bunny e o basquetebolista Michael Jordan. O sucesso de ambas as peças publicitárias, realizadas por Joe Pytka, levou a uma reunião entre um executivo da marca desportiva e o produtor Ivan Reitman com vista a expandir a colaboração para o grande ecrã. A inesperada retirada de Jordan da NBA no final da época de 1993 chegou a cancelar todos os planos para um filme mas o seu regresso dois anos mais tarde reabriu o projecto inicial. Pytka foi escolhido como realizador e a Warner Bros teve que centrar toda a sua divisão de animação para trabalhar no filme, incluindo mão-de-obra que já estava alocada a outros projectos, face à exigência da complexidade técnica do mesmo. O argumento, elaborado em conjunto por quatro guionistas, foi redigido incorporando uma ficcionalizada história do período entre a referida retirada de ‘MJ’ da NBA para jogar basebol e o seu regresso aos courts.

A acompanhar Jordan na interacção com os desenhos animados dos Looney Tunes estão Wayne Knight (o eterno carteiro Newman de ‘Seinfeld’) e Bill Murray, ao passo que a antiga estrela Larry Bird e uma série de jogadores da NBA também têm direito a algumas cenas. Quanto às personagens dos Looney Tunes, foram contratados vários profissionais para darem voz aos diferentes desenhos animados, contrastando com o sucedido nas décadas anteriores, quando era o extraordinário Mel Blanc (falecido em 1989) a assegurar praticamente todas elas. Billy West (criador das vozes principais da série de animação ‘Ren & Stimpy’) interpreta, desta vez, Bugs Bunny e o conhecido actor Danny DeVito providencia a voz do vilão principal Swackhammer. ‘Space Jam’ foi um sucesso a nível de bilheteiras, vídeo e merchandising e até em termos de banda sonora, platinada por 6 vezes. Inclui canções como ‘Fly Like an Eagle’, uma versão de Seal do original da Steve Miller Band, e ‘I Believe I Can Fly’, de R. Kelly.

Comecei a interessar-me mais pelo basquetebol e pela NBA no início da década de 90 muito por culpa de um programa transmitido pela RTP2 chamado ‘NBA Action’. Durante cerca de uma hora, os espectadores eram brindados com resumos e as jogadas mais espectaculares da semana, relatados de forma apaixonante por Carlos Barroca e pelo professor João Coutinho. O interesse já cá estava mas aumentou exponencialmente quando um dos nossos amigos de infância, um verdadeiro entusiasta deste desporto, nos “contagiou” a todos com a sua paixão pela NBA. Em pouco tempo já quase todos ensaiávamos uns jogos de basquetebol no lugar onde habitualmente jogávamos futebol, torcíamos pelas nossas equipas preferidas, trocávamos cartas de colecção e jogávamos ‘NBA Live’ nas consolas. Quando estreou ‘Space Jam’ nos cinemas foi sem surpresa que decidimos ir ver o filme a Lisboa. Com idades entre os 16 e os 17 anos, já não eram tanto os Looney Tunes que nos entretinham no ecrã mas sim a “magia” proveniente da NBA e o seu melhor jogador de sempre: Michael Jordan. É justo dizer que a obra de Pytka não é mais do que um simpático filme de família, agradando principalmente a crianças e adolescentes, mas pelo menos entretém e combina bem o humor auto-referencial das estrelas do basquetebol norte-americano com o espírito dos clássicos Looney Tunes. O mesmo não se pode dizer da sua sequela ‘Space Jam: Uma Nova Era’, com a estrela da actualidade LeBron James a ocupar o lugar de ‘MJ’. James não tem a presença e o carisma de Jordan e isso é visível no filme estreado o mês passado, que fica mesmo muito atrás do original. Até o próprio Bugs Bunny perde brilho nesta nova película. That’s all folks!

Música: ‘Plush’ — Stone Temple Pilots (1992)

Os Stone Temple Pilots, também conhecidos por STP, são uma banda de rock formada em 1989 em San Diego, na Califórnia. O quarteto fundador consistiu em Scott Weiland (voz), os irmãos Dean DeLeo (guitarra) e Robert DeLeo (baixo) e Eric Kretz (bateria). Este alinhamento manteve-se até 2013, altura em que Weiland foi despedido da banda, acabando por falecer dois anos mais tarde. O substituto temporário durante um par de anos foi Chester Bennington, dos Linkin Park, sendo que actualmente o lugar de vocalista é ocupado por Jeff Gutt, antigo líder da banda de nu metal Dry Cell.

O álbum de estreia — ‘Core’, de 1992, foi um grande sucesso comercial e os STP tornar-se-iam uma das bandas mais bem-sucedidas dessa década, vendendo mais de 40 milhões de discos em todo o mundo. Só ‘Core’ foi certificado 8 vezes platina pela Associação Discográfica da América e teve três canções lançadas como singles: ‘Sex Type Thing’, ‘Creep’ e ‘Plush’. A última é seguramente a mais conhecida de toda a carreira da banda, tendo atingido o lugar cimeiro da tabela de rock da prestigiada Billboard. Com o seu arranjo de cordas característico e uma batida forte e lenta, ‘Plush’ foi galardoado, entre outros prémios, com um Grammy por melhor performance de hard rock e o respectivo videoclipe, com rotação frequente na MTV, foi também reconhecido pelo canal com um troféu na cerimónia de 1993.

É inevitável falar de um antes e depois de Scott Weiland no que diz respeito aos Stone Temple Pilots. O carismático ex-vocalista era também o principal compositor da banda e a sua camaleónica alternância entre diferentes registos vocais foi patente nos quatro álbuns que se seguiram a ‘Core’. Após alguns conflitos internos, os STP cessaram a sua actividade em 2003 e Weiland formou o supergrupo Velvet Revolver com Slash, Duff McKagan e Matt Sorum, todos eles ex-membros dos Guns N’ Roses. A colaboração rendeu dois álbuns relativamente bem-sucedidos (especialmente o primeiro) e estendeu-se até 2008, altura em que Weiland e os STP voltaram a juntar-se. Gravaram apenas mais um álbum até que a dependência das drogas por parte do vocalista ditou a sua expulsão. Actualmente, a banda mantém-se em actividade embora fora do radar mediático.

A sonoridade dos Stone Temple Pilots pode ser considerada uma espécie de fusão entre o rock alternativo dos anos 80 e 90 e o hard rock da década de 70 mas no início de carreira foram catalogados como grunge. Apesar de não serem originários de Seattle ou mesmo do estado de Washington de onde surgiram os grandes nomes deste estilo musical (Soundgarden, Nirvana, Pearl Jam e Alice in Chains), os STP ainda hoje são referidos muitas vezes como o “quinto grande” do grunge, especialmente pelas semelhanças em termos de letras e de arranjos com as duas últimas bandas da lista. Pessoalmente nunca me preocupei muito com isso, apenas que gosto da sua sonoridade e intensidade das suas canções. ‘Plush’ é uma das minhas músicas preferidas de sempre, tanto para ouvir como para cantar, e marcou a minha geração.

Videojogo: ‘NBA Live 96’ (1995)

A notoriedade do basquetebol como um dos desportos mais populares do mundo tem vindo a traduzir-se no mundo dos videojogos desde o início da década de 70 do século passado. Os primeiros jogos, muito rudimentares, apareceram para as consolas da Magnavox e Atari. Nos anos 80, a quantidade e variedade de títulos para as diferentes plataformas aumentaram consideravelmente, assistindo-se também a parcerias com estrelas da NBA como Julius Erving, Larry Bird, Michael Jordan e Magic Johnson a darem nome a alguns dos jogos. O primeiro videojogo completamente licenciado pela própria NBA seria ‘Lakers versus Celtics and the NBA Playoffs’ (1989), da Electronic Arts, com 8 equipas presentes e todos os nomes reais dos jogadores.

Na década de 90 a aposta na maior liga de basquetebol do mundo foi ainda mais evidente, com o surgimento de franquias que se tornariam muito bem-sucedidas. ‘NBA Jam’, da Midway, foi lançado em 1993 e caracterizava-se pela espectacularidade dos afundanços e demais movimentos assumidamente exagerados ou mesmos irreais, em partidas de dois para dois. A EA Sports havia lançado ‘NBA Showndown’ no mesmo ano e em 1994 deu início à série ‘NBA Live’, que se tornaria a mais completa e popular simulação de basquetebol dos 15 anos seguintes. O primeiro título da franquia — ‘NBA Live 95’ — assentou sobre uma versão modificada do motor de jogo de ‘FIFA International Soccer’ (1993) da mesma EA Sports e que tanto sucesso fez com a sua inovadora perspectiva isométrica do campo. O seguinte ‘NBA Live 96’ trouxe como novidades a tecnologia ‘Virtual Stadium’ e a sua multiplicidade de ângulos de câmara assim como a existência de uma lista de jogadores livres seleccionáveis (os chamados free agents) e a possibilidade de criar o nosso próprio jogador. Esta era, aliás, a forma de contornar o facto de algumas das maiores estrelas da NBA como Michael Jordan e Charles Barkley não estarem inicialmente disponíveis devido a questões de licença. Ao colocar os seus apelidos na criação de um novo jogador, o sistema automaticamente reconhecia as vedetas da competição com os seus atributos e características próprias já carregadas.

‘NBA Live 96’ foi o primeiro jogo da série a ser lançado para a PlayStation original, a consola dominadora da sua geração. A predominância da marca ‘NBA Live’, até então com um jogo colocado no mercado todos os anos, só seria quebrada no início da década passada quando a concorrente ‘NBA 2K’ a ultrapassou tanto em popularidade como em números de vendas. A rivalidade ainda subsistiu até 2018, ano do último ‘NBA Live 19’, mas a superioridade a todos os níveis de ‘NBA 2K19’ implicou que a divisão de videojogos de desporto da Electronic Arts cancelasse todos os planos para futuros títulos de basquetebol. A ascensão da série de jogos da 2K Sports explica-se pela inclusão de um grande número de equipas clássicas de diversas temporadas, modos de carreira cativantes e com grande detalhe de aproximação à realidade (em ‘NBA 2K16’, por exemplo, o mesmo foi realizado pelo conhecido cineasta e entusiasta de basquetebol Spike Lee) e pela implementação de um sistema de cartas em que o jogador pode criar uma equipa de sonho para defrontar outros jogadores on-line, curiosamente (e ironicamente) um modo muito semelhante ao do ‘Ultimate Team’ da série de jogos ‘FIFA’, um dos maiores sucessos que distingue a série de videojogos de futebol da rival EA Sports.

O meu primeiro contacto com jogos de computador de basquetebol deu-se através de duas criações do país vizinho, reflexo do que é hoje chamada a “era de ouro do software espanhol”. O termo faz referência a uma época, aproximadamente entre 1983 e 1992, durante a qual Espanha chegou a ser, atrás do Reino Unido, uma das maiores produtoras europeias de software de entretenimento para máquinas de 8 bits, sobretudo para o ZX Spectrum. E foi precisamente através deste computador que conheci ‘Fernando Martín Basket Master’ (1987) da Dinamic e ‘Golden Basket’ (1990) por parte da Opera Soft. Era interessante poder disfrutar do baloncesto no Spectrum mas a qualidade deixava algo a desejar, pelo que a verdadeira satisfação de jogar basquetebol de comando na mão só chegou mesmo com a Mega Drive e ‘NBA Live’. O primeiro da série joguei muito em casa de um amigo meu e acabei por comprar o seguinte. Lembro-me de fazer épocas inteiras ou playoffs com os “meus” Phoenix Suns e de apontar os resultados e algumas estatísticas. Com o interesse na NBA a contagiar grande parte do grupo de amigos, ‘NBA Live 96’ passou a ser uma frequente alternativa ao ‘FIFA’ que nos fazia juntar para tardes de jogatana na consola da Sega.