Total 90s — XII

Neste especial (mas pouco) de Natal: um clássico da época e um filme de família em que a família está ausente; um álbum que alterna entre o bom, o mau e o rasca e um trio de diferentes videojogos que encaixam todos no mesmo cartucho.

Filme: ‘Sozinho em Casa’ — Home Alone (1990)

Quando os McCalisters partiram apressadamente para férias, esqueceram-se de um pequeno “detalhe”… o seu filho mais novo de oito anos! Deixado acidentalmente para trás pela sua família alargada nas férias de Natal em França, Kevin McCalister (Macaulay Culkin) torna-se, da noite para o dia, o homem da casa. Sozinho, tímido e desajeitado ele tenta resolver os seus problemas: ir às compras, cozinhar, lavar a roupa e até tomar banho. Mas tudo se complica quando os ladrões Harry (Joe Pesci) e Marv (Daniel Stern) tentam assaltar a sua casa e ele tem de a defender da única maneira que sabe e pode.

O argumentista e produtor John Hughes concebeu a ideia para o filme quando ele próprio preparava uma viagem de férias com a sua família e imaginou como seria se se esquecesse do filho de 10 anos em casa. Hughes escreveu oito páginas de notas que posteriormente desenvolveu no argumento que apresentou à Warner Bros mas após um desacordo no que diz respeito às verbas do orçamento, o projecto acabou por passar para as mãos da 20th Century Fox. O cineasta norte-americano Chris Columbus foi escolhido como realizador e Macaulay Culkin como protagonista após a participação elogiada do jovem actor em ‘O Meu Tio Solteiro’, filme realizado por Hughes no ano anterior. O conceituado John Williams assinou a banda sonora que juntamente com a canção ‘Somewhere in My Memory’ mereceram nomeações aos Óscares por parte da Academia.

No seu fim-de-semana de abertura, ‘Sozinho em Casa’ arrecadou 17 milhões de dólares em 1202 cinemas norte-americanos. Provou ser tão popular que permaneceu em exibição bem depois da época de Natal. Foi o filme número um nas bilheterias por 12 semanas consecutivas, desde o fim-de-semana de lançamento em meados de Novembro até Fevereiro de 1991. Contrariamente ao que era habitual, a Fox colocou o filme para venda em VHS ainda antes de o disponibilizar para aluguer nos clubes de vídeo. Agrupando os números de bilheteira e de home video, a obra de Chris Columbus detém o recorde do Guiness de comédia com a maior receita de sempre. O filme tornou Culkin uma estrela infantil a nível mundial mas o actor nova-iorquino não voltaria a alcançar semelhante sucesso ao entrar na idade adulta.

Chegou aquela altura do ano: as ruas estão mais iluminadas, as famílias trocam presentes e… ‘Sozinho em Casa’ passa na televisão. Tem sido assim desde o início da década de 90 praticamente de forma ininterrupta a cada período natalício. Tornou-se um clássico intemporal e quase tão típico como o bolo-rei, sonhos ou rabanadas. Tendo eu precisamente a mesma idade que Macaulay Culkin foi natural identificar-me com aquela personagem de “puto reguila” quando vi a película pela primeira vez. Original e divertido, o primeiro filme deu origem a uma saga que foi perdendo qualidade. Se a sequela ‘Sozinho em Casa 2: Perdido em Nova Iorque’ (1992) ainda mantém algum interesse porque volta a contar com a equipa do original, à frente e atrás da câmara, todos os fraquíssimos quatro filmes que foram lançados posteriormente (alguns directamente para vídeo) representam somente uma tentativa falhada de reciclagem da ideia original e exploração do nome da franquia.

Álbum: ‘A Idade do Pecado’ — Vários (1996)

Se ‘Sozinho em Casa’ é “o” filme de Natal da década de 90 que volta todos os anos por esta altura às televisões das nossas casas, mesmo que por zapping ocasional, ‘All I Want for Christmas Is You’ de Mariah Carey é o seu equivalente musical presente nas rádios e estabelecimentos comerciais. Nesse sentido, até poderia ser a música escolhida para abordar este mês mas há falta de razões suficientes para escrever sobre o célebre tema de 1994 da cantora norte-americana, destaco uma colectânea de canções portuguesas lançada em 1996 e que não tem absolutamente nada a ver com a época natalícia. O facto de ter sido uma oferta de Natal e de me ter deixado uma marca na memória da década em questão confere-lhe o critério suficiente para a escolha deste mês. Editado pela MCA Music Entertainment e com um aviso na capa a referir que continha termos obscenos, o álbum reúne 15 canções em língua portuguesa, a saber:

01. Alex e os Putos do Bairro — Bow Wow Wow (Tá-se Bem)

02. Os Lunáticos — Estou na Lua

03. Mau Maria — Vai-te Lixar

04. Iris — Oh Mãe!!

05. Ena Pá 2000 — És Cruel

06. Mercúrioucromos — Indecências

07. Ex-Votos — Subtilezas Porno Populares (Pimba!)

08. Mata Ratos — A Minha Sogra é um Boi

09. Despe e Siga — Bué da Baldas

10. Paulo Gonzo — Tiro à Queima-Roupa

11. Alcoolémia — Não Sei se Mereço

12. Black Company — Pura Ressaca

13. Ràp — Má Língua (F…da-se!)

14. Big Beto — Mulher Feia

15. Pedro Abrunhosa — Talvez F***r

Quando rasguei o embrulho e vi o que a minha cunhada me tinha comprado certamente expressei um sorriso amarelo. Afinal, nunca fui um grande entusiasta de música portuguesa e as bandas e artistas no alinhamento do álbum não eram muito do meu agrado. O meu irmão do meio também estava desapontado com o CD que lhe calhou e acabámos por nos rir bastante do sucedido.

Passados 25 anos, reavalio ‘A Idade do Pecado’ de forma diferente. Não passou propriamente a ser um grande álbum e dentro dos meus gostos musicais mas reconheço-lhe o mérito de espelhar o panorama musical português de meados da década 90, mais propriamente dos tempos da “geração rasca”. O termo, cunhado pelo jornalista e cineasta Vicente Jorge Silva em 1994 aquando das manifestações estudantis contra as provas globais no Ensino Secundário, ficou para a história e alguns dos temas no disco são evocativos disso. A inspirada letra de ‘Bué da Baldas’ (uma adaptação do original ‘Baggy Trousers’ dos ingleses Madness) faz-me recuar até ao meu 10º ou 11º ano de escolaridade e a todo um tempo em que as típicas angústias juvenis eram as minhas únicas preocupações na vida, ainda bem longe das responsabilidades de adulto.

Há, ainda assim, músicas no álbum que até hoje continuo a não gostar: ‘Estou na Lua’, o único êxito de carreira dos Lunáticos; ‘Mulher Feia’, simplesmente sofrível e a única contribuição em português do Brasil no disco ou mesmo a canção de Alex e os Putos do Bairro que abre o CD, construída integralmente sobre um sample de um tema de Snoop Dogg, o que não foi mais do que uma clara jogada de publicitação do único grupo no álbum sob contracto com a MCA. Há ainda canções que parecem um pouco desalinhadas da maioria, tanto a nível temático como geracional, mas que figuram no alinhamento provavelmente pela presença de obscenidades nas suas letras, sendo exemplos disso ‘A Minha Sogra é um Boi’, “hino” do punk lusitano datado de 1990 dos Mata Ratos, ou ‘És Cruel’, uma das mais conhecidas músicas de 1992 dos irreverentes Ena Pá 2000.

Videojogo: ‘Mega Games I’ (1992)

Tal como aconteceu na categoria musical, também em termos de videojogos não me recordo de ter jogado algum título de temática natalícia e muito menos que me tenha marcado. Desta forma, recorro igualmente a uma memória referente a uma prenda de Natal, mais concretamente do período festivo de 1992. Foi o ano em que recebi a Mega Drive, que vinha com quatro jogos: ‘Sonic the Hedgehog’ e uma compilação de três títulos, já lançados anteriormente de forma individual, chamada ‘Mega Games I’. O jogo da mascote da Sega dominou os primeiros tempos de utilização da consola até que comecei a experimentar o outro cartucho que continha um jogo de motas, outro de puzzles e ainda um de futebol.

Super Hang-On

Originalmente lançado para as máquinas de arcade em 1987 e posteriormente adaptado a computadores e consolas, a sequela do aclamado ‘Hang-On’ (1985), igualmente desenvolvida por Yu Suzuki, consiste em completar uma determinada etapa antes que o tempo se esgote. O jogador tem à sua escolha quatro continentes por onde competir, sendo que estes também funcionam como níveis de dificuldade das respectivas corridas. O percurso de África é o mais curto e mais fácil, seguindo-se Ásia, Américas e Europa, que representa o maior desafio com um total de 18 etapas. É ainda possível escolher entre quatro músicas disponíveis para acompanhar o motociclista no trajecto. Para além do modo de jogo em tudo similar ao original arcade, a versão para a Mega Drive inclui ainda um modo original em que o jogador enfrenta um rival da inteligência artificial na disputa pelo melhor tempo cronometrado, tendo a possibilidade de recrutar patrocinadores e desta forma amealhar dinheiro para poder adquirir melhores componentes para a sua mota.

Columns

A explosão de popularidade de ‘Tetris’ no final da década de 80 originou uma série de outros jogos de quebra-cabeças mais ou menos do mesmo estilo. Usando jóias em vez de figuras geométricas, o jogo desenvolvido por Jay Geertsen chegou primeiramente às máquinas dos salões de jogos em 1990. Colunas de três jóias vão caindo num painel, e o jogador deve arrumá-las de modo a juntar fileiras de ao menos três jóias iguais na vertical, horizontal ou diagonal, de modo a que estas colunas desapareçam, evitando assim que o painel fique cheio. A adaptação para a Mega Drive trouxe o modo original e também a versão “Flash Columns”, cujo objectivo é eliminar uma jóia que brilha no fundo do painel, podendo para isso contar com a presença de um segundo jogador em modo cooperativo. Destaque para as três músicas principais de jogo, baseadas em temas gregos, criadas por Tokuhiko Uwabo.

World Cup Italia ‘90

Após a britânica Virgin Mastertronic ter adquirido os direitos para produzir um videojogo oficial do Campeonato do Mundo de Futebol de 1990 e ter lançado ‘World Cup Soccer: Italia ‘90’, a Sega interessou-se em ter também um jogo oficial do torneio da FIFA. Servindo-se do seu próprio ‘World Championship Soccer’, que apenas foi distribuído para o mercado norte-americano em 1989, a gigante nipónica estabeleceu uma parceria com a Olivetti e a detentora dos direitos e basicamente lançou o mesmo jogo para a Mega Drive na Europa, com a ligeira alteração de nome para reflectir a licença do Mundial de Futebol. O videojogo apresenta uma perspectiva aérea, cores vivas e música ambiente consoante o adversário mas é também uma simulação muito simplista de futebol onde não há faltas, substituições ou a possibilidade de escolher um sistema táctico que não o 4–4–2. Apesar de muito básico e dos defeitos que hoje lhe possam ser apontados, a verdade é que foi durante três anos (de 1989 até 1992, entre a versão americana e europeia) o único jogo de futebol da Mega Drive lançado no mercado e isso garantiu-lhe um lugar na história.